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terça-feira, dezembro 27, 2005

Só nos restam as maldições

Continuação
Malditos sejais, ladrões, gatunos, pichelingues, unhantes , ratoneiros, trabuqueiros dos dinheiros públicos, dos quais agadanhais, expropriais cerca de 20 por cento de todos os orçamentos, deixando viadutos no ar, pontes no nada, esgotos a céu aberto e crianças mortas de fome, mortas de tudo, enquanto trombeteais programas populistas inócuos.
Que a maldição de todas as pragas do Egito e do Deuteronômio vos impeça de comer os frutos de vossas fazendas escravistas, que não possais degustar o pão de vossos fornos, nem o milho de vossos campos, e que vossas amantes rancorosas vos traiam e contaminem com as mais escabrosas doenças e repugnantes feridas!
Malditos sejais, carecas sinistros, valérios sem valor, homúnculos dedicados a se infiltrar nas brechas, nas breubas do Estado para malversar, rapinar, larapiar desde pequenas gorjetas como a do Marinho, naquele gesto eternizado na TV, até grandes negociarrões com empresas fantasmas em terrenos baldios!
Malditas sejam as caras de pau dos ladravazes, com seus ascorosos sorrisos frios, imunda honradez ostentada, tranqüilo cinismo, baseado na crapulosa legislação que os protege há quatro séculos, por compradiços juízes, legisperitos fariseus que vendilham sentenças por interesses políticos, ocultados por intrincados circunlóquios jurídicos, solenes lero-leros para compadrios e favores aos poderosos; que vossas togas se virem em abutres famintos que vos devorem o fígado, acelerando vossas mortes que virão pelo tédio e por vossa ridícula sisudez esclerosada com que justificais repulsivas liminares e chicanas, que liberam vagabundos ricos e apodrecem pobres pretos na boca do boi de nossas prisões!
Malditos sejais, falsos revolucionários, medíocres carbonários agarrados em utopias velhas de um século, ignorantes que disfarçam a própria estupidez em ideologia, para os fins mais asnáticos, através de meios estapafúrdios; malditos sejam os 25 mil canalhas infiltrados pelos bolchevistas-dirceuzistas-genoínicos na máquina pública, emperrando-a e sugando migalhas do Estado com voracidade e gula! Tomara que sejais devorados pelos carunchos que rastejam nos arquivos empoeirados da burocracia que impede o país de andar! Que a poeira dos arquivos mortos vos sufoque e envenene como o trigo roxo dos ratos!
Malditas sejam também as “consciências virginais”, as mentes “puras” que se escandalizam com os horrores, mas nada fazem; malditos os alienados e covardes, malditos os limpos, os não-culpados, os indiferentes, que se acham superiores aos que sofrem e pecam; malditos intelectuais silenciosos que ficam agarrados em seus dogmas e que preparam a espúria reeleição dessa gente e a chegada posterior dos populistas e falsos evangélicos mais sórdidos do país!
Malditos sejam também os governistas que ousam negar o mensalão, malditos sejam os técnicos despudorados que ostentam uma “seriedade” lógica e contábil nos fundos de pensão e em estatais, de onde jorrou o grosso do dinheiro do valerioduto, tão bem ilustrado pelo jato de água e lama na fazenda do Delúbio, com sua cara destabocada e de maus dentes! Malditas sejam as metáforas que escorrem dos bolsos do Lula como pequenas lesmas, gordas sanguessugas, carrapatos infectos. Que essas metáforas lhe carcomam o corpo e que seus bonés, barretes, toucas e gorros de Papai Noel demagógico lhe atazanem o crânio até ele confessar que sabia de tudo, sim! Que sua cara denuncie tudo o que ele é, desde a vermelhidão crescente de suas bochechas até as sobrancelhas de diabo que traem o sorriso populista para enganar os mais pobres!
Malditos os que querem desfazer a única coisa que segurou o Brasil nesses três anos: a “herança bendita” da economia; malditos os que desejam destruí-la para trazer de volta a inflação e a irresponsabilidade fiscal, malditos anjos da cara suja, malditos olhinhos vorazes, malditos espertos fugitivos da cassação, anatematizados e desgraçados sejam os que levam dólares na cueca e, mais que eles, os que levam dólares às Bahamas, malditos os que usam o “amor ao povo” para justificar suas ambições fracassadas, malditos severinos que rondam ainda, malditos waldomiros e waldemares que rondam ainda, malditos dirceus, arroz-de-festa de intelectuais mal informados, malditos sejam, pois neles há o desejo de fazer regredir o Brasil para o velho Atraso pustulento, em nome de suas doenças mentais infantis!
Se eles prevalecerem, voltará o dragão da Inflação, com sete cabeças e dez chifres e sete coroas em cada cabeça, e a prostituta do Atraso virá montada nele, berrando todas as blasfêmias, vestida de vermelho, segurando uma taça cheia de abominações, suas fornicações e ela, a besta do Atraso, estará bêbada com o sangue dos pobres e em sua testa estará escrito: Mãe de todas as meretrizes e Mãe de todos os ladrões que paralisam nosso país.
Só nos resta isso: maldizer.
Portanto: que a peste negra vos devore a alma, políticos canalhas, que vossos cabelos com brilhantina vos cubram de uma gosma repulsiva, que vossas gravatas bregas vos enforquem, que os arcanjos de 2006 vos exterminem para sempre!


Feliz ano novo!


Arnaldo Jabor em O Globo

segunda-feira, dezembro 05, 2005

Candidatura acintosa

Claudio Weber Abramo
Há algum tempo noticia-se que Nelson Jobim, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), alimentaria ambições políticas. Fala-se numa possível candidatura à Presidência ou vice-presidência da República, neste caso numa chapa PT-PMDB. Como o sr. Jobim não vem a público para desmentir tais intenções, fica-se com a impressão de que as versões procedem e que, portanto, ele estaria se articulando para materializar o intuito. Sendo esse o caso, não há outra forma de se referir a tal candidatura senão como um acinte.
Constitui agressão ao princípio de separação de Poderes a circunstância de o presidente da mais alta corte de Justiça do país, com intervenção direta nos conflitos políticos e econômicos mais relevantes, pleitear um cargo eletivo. Não importa que, em decorrência de uma interpretação gramatical da Constituição, o sr. Jobim teria o "direito" de concorrer. O dever de manutenção de uma moralidade mínima lhe retira esse pretenso direito. Mais, dado o poder de intervenção que o presidente da Suprema Corte tem sobre todos os assuntos que passam por ali, tal intenção eleitoral colocaria sob suspeita todas as decisões do STF, e não apenas aquelas que dizem respeito a temas de natureza política. Há entre as alegadas ambições do presidente do STF e sua função no tribunal um conflito de interesses cuja persistência é intolerável. Se o sr. Jobim de fato nutre a ambição noticiada, todos os atos do colegiado do Supremo são lançados no mesmo buraco negro de suspeição.
Ao pretender transitar entre dois Poderes, o presidente do STF estende seu conflito de interesses ao conjunto dos demais magistrados.
Em particular, dá asas à desconfiança de que as interferências do Supremo nos assuntos do Congresso Nacional, que se tornaram freqüentes durante o processo movido no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados contra o sr. José Dirceu, se explicariam como investimento em favor da ambição eleitoral de seu presidente.
Usando o caso do agora ex-deputado apenas como exemplo, para muitos ficou óbvio que a intromissão do STF não atendeu ao anseio de servir à justiça, mas às finalidades procrastinatórias de Dirceu. As firulas inúteis que se discutiram, como ouvir testemunhas nesta ou naquela ordem, incluir ou extirpar parágrafos de relatórios, aventar aspectos processuais, em nada alteraram a natureza fundamental do processo político, que, como diz o nome, era e é político, e não jurídico, como, aliás, apontou o ministro Joaquim Barbosa, no que foi verberado por alguns de seus colegas, a começar pelo presidente do STF.
O destino de um parlamentar levado a julgamento numa Casa do Congresso é traçado pela história das relações construídas ou destruídas e pelas articulações e negociações conduzidas por apoiadores e opositores. Esse destino não só passa pelas "provas dos autos" no sentido jurídico mas, antes e principalmente, por elementos de convicção inferidos ao longo do processo e colhidos de toda parte, do noticiário da imprensa às conversas ao pé do ouvido. O que se exige é a garantia do direito de defesa, o que, nos casos recentes, numa visada de bom senso em contraposição à visada formalista, foi amplamente satisfeito.
A melhor demonstração de que o acolhimento de manobras de advogados de políticos não tem fundamento prático é que nenhum parlamentar que vote independentemente do que está escrito no relatório pode ser cobrado por isso, nem o resultado da votação pode ser contestado - mesmo porque o relatório é, ele próprio, culminância de um procedimento político, e não jurídico, em que interferem muitos fatores extraprocedimentais. Os parlamentares são a um tempo promotores, advogados de defesa, júri e juízes. Na formação de sua opinião e na consignação de seu voto, não respondem a ninguém senão ao eleitor.
Mais importante ainda, deputados são também testemunhas. O que cada um dos parlamentares conhece sobre a atividade de seus pares, dos agentes partidários e governamentais, dos negócios que se fazem pelos gabinetes, pouquíssimo disso chegando ao conhecimento público, deveria ser suficiente para dissipar qualquer ilusão de que poderiam eles participar de um processo de cassação com a isenção formal imaginada por certos ministros do STF -um dos quais chegou a estabelecer paralelo entre tal processo e aquele decorrente de um atropelamento de trânsito.
O que ocorre num julgamento parlamentar é muito diferente do que acontece num tribunal. Ao menos em princípio, um juiz que decida afrontando o que estiver nos autos, ou que o faça ferindo o rito processual, expõe-se a ter a decisão revertida na instância seguinte.
Sugerir que as convicções que governam o julgamento político precisariam formar-se seguindo o rito processual judicial é pretender ignorar a distinção entre política e direito. Não se pode confundir uma coisa com a outra, sob o risco de transformar a vida política em matéria de advogados.
A confusão que se pretende criar nada tem de doutrinária. Ao contrário, leva marcas de ser intencional, impressão essa que a alegada candidatura Jobim só reforça. Ao se admitir que um magistrado seja candidato a cargo eletivo, destrói-se a separação entre Poderes e se confere legitimidade ao concubinato entre o interesse político e a função mediadora da Justiça. Se de fato existente, a candidatura Jobim é inaceitável.

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