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sexta-feira, setembro 02, 2005

Trabalho informal

Trabalho informal aprisiona pessoas na pobreza

Mulheres são as maiores vítimas desta forma de exclusão social

Noeleen Heyzer* Em Nova York

Tradução: Danilo Fonseca
Em um universo de trabalho que cruza cada vez mais as fronteiras, estamos descobrindo que a globalização não gera necessariamente empregos melhores e mais seguros. O trabalho autônomo, casual ou residencial, juntamente com os empregos de meio expediente e temporários, respondem por uma parcela entre 50% e 80% do trabalho urbano nos países em desenvolvimento (a percentagem é ainda mais alta se incluirmos o setor agrícola). Nos países desenvolvidos esses trabalhos informais respondem por 20% ou 30% do número total de empregos. E, em vez de o trabalho informal se tornar formal à medida que as economias crescem, o trabalho está passando de regulamentado a desregulamentado. Os trabalhadores perdem a segurança empregatícia, assim como benefícios médicos e outras vantagens, e laboram em condições inseguras para conseguirem contracheques cada vez mais miseráveis e não confiáveis. Essa tendência é particularmente pronunciada para as mulheres, que tendem a ter uma representação excessiva no mercado de trabalho informal, tanto nos países em desenvolvimento quanto nos desenvolvidos. As mulheres compõem a maioria da força de trabalho de meio-expediente e temporária nos países desenvolvidos, enquanto nas nações em desenvolvimento (com a exceção do norte da África), 60% ou mais das mulheres trabalhadoras se inserem no mercado de trabalho informal (excluindo o setor agrícola). As mulheres das zonas rurais passam horas trabalhando arduamente em culturas familiares, freqüentemente sem receberem qualquer remuneração. Aquelas das áreas urbanas trabalham em fábricas não regulamentadas, ganhando centavos pela produção de artigos que são remetidos para mercados distantes. Além do mais, a totalidade do trabalho feminino continua sendo mal entendida e estudada. Em praticamente todos os países, as mulheres ainda são as principais responsáveis pela criação das crianças, e pelos cuidados dispensados aos doentes e aos idosos, o que lhes limita a capacidade de obterem a educação e a experiência exigidas para que consigam empregos mais bem pagos. Nos países onde os sistemas de saúde estão sendo devastados pela Aids, as mulheres arcam com um peso ainda maior no que diz respeito a prover cuidados para os doentes. Sabemos que as conseqüências de se trabalhar informalmente não se restringem aos baixos salários, incluindo também a ausência de direitos humanos e de inclusão social. Comparados aos indivíduos que trabalham na economia formal, os que atuam na economia informal possuem menos acesso a água limpa, eletricidade e serviços sociais; são mais vulneráveis à perda de propriedade e à incapacitação; e contam com menos acesso a bens financeiros, físicos e outros. É difícil imaginar um maior distanciamento físico e psicológico, ou um maior desequilíbrio - em termos de poder, rendimento e estilo de vida - do que o existente entre a mulher que costura roupas ou bolas de futebol na sua casa no Paquistão para uma rede de varejo na Europa ou na América do Norte e o diretor-executivo de tal companhia. Em antecipação à Conferência Mundial de 2005 das Nações Unidas, neste mês, quando os líderes internacionais se reunirão para avaliar o progresso rumo às Metas de Desenvolvimento do Milênio, a minha organização está defendendo uma avaliação mais cuidadosa das questões da mulher, do trabalho e da pobreza. A premissa básica é que o trabalho decente é um direito humano, sendo fundamental para a segurança econômica. A menos que se envidem esforços para a criação de empregos decentes para a força informal de trabalho, não seremos capazes de eliminar a pobreza ou de obter a igualdade entre os sexos, e tampouco de atingir as metas propostas para o milênio. Similarmente, a menos que a segurança econômica feminina seja fortalecida, qualquer progresso real quanto a essas metas será limitado. Para que haja progresso, quatro áreas devem se constituir em prioridades:

· Primeiro, a organização dos trabalhadores informais, especialmente as mulheres, para a obtenção de proteção legal e social. A menos que as mulheres sejam fortalecidas para exigirem os seus direitos, a sociedade não implementará as mudanças que melhorarão as suas vidas.

· Segundo, a articulação de um grande esforço no sentido de ajudar os trabalhadores autônomos, a fim de melhorar o acesso destes aos mercados financeiros e de crédito e criar demanda pelos seus produtos e serviços.

· Terceiro, a criação de políticas apropriadas de apoio aos trabalhadores informais, que exijam que estes se tornem visíveis para a sociedade e que a totalidade do seu trabalho --especialmente no caso das mulheres - seja valorizado. O ponto de partida é a coleta e a análise de estatísticas sobre as forças de trabalho nacionais que levem em conta os dois sexos. E, finalmente, o fortalecimento de estratégias para colocar um fim à desigualdade entre os sexos. Acabar com as diferenças entre os salários de homens e mulheres e garantir condições de trabalho seguras e saudáveis para todos deveria ser um objetivo central da elaboração de políticas. A erradicação da pobreza e a promoção da igualdade entre os sexos é algo que exige uma grande reorientação de políticas econômicas e de desenvolvimento. É fundamental que todos aqueles comprometidos com a proposta de se atingir as metas do milênio, incluindo o sistema das Nações Unidas, os governos e as instituições internacionais de comércio e finanças, façam do trabalho decente uma prioridade, e que as corporações no mercado global melhorem as condições para todos os seus empregados, tantos formais quanto informais.
*Noeleen Heyzer é diretor-executivo do Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para as Mulheres.