Continuação
Não é uma torcida de Primeira Leitura. É uma avaliação corrente no setor de aviação e de analistas de bancos que acompanham as empresas do setor. Considerada essa premissa, o que passa a ser importante é indagar se vai prevalecer o discurso da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, e do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que qualquer solução para a companhia não deverá implicar gasto de dinheiro público. Ou o critério político, de um governo que não estaria interessado em deixar quebrar uma empresa de 75 anos, com 10,4 mil funcionários, às vésperas de uma eleição presidencial.
O ministro da Defesa, Waldir Pires, como todo novato disposto a mostrar serviço, já deu sinais de que está interessado numa operação de socorro. Afinal, como ele mesmo afirma, embora salvar a Varig não seja um “ato simples do governo”, sua situação quase falimentar é um “assunto importante até pela longa tradição da empresa no país”.
Na segunda-feira, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) vetou a proposta apresentada pela OceanAir de fretar aviões da Varig por seis meses. A entidade alegou razões técnicas e jurídicas para rejeitar a proposta. A OceanAir pagaria as contas da Varig, excluindo as dívidas antigas, durante o tempo em que assumisse as linhas da aérea. Ao fim do período, ficaria com 10% dos horários e espaços da Varig nos aeroportos.
Nas atuais circunstâncias, são remotas as chances de a Varig sobreviver. Duas das três alternativas para a empresa parecem bloqueadas no momento. Vejamos.
1 — Não há expectativa de aporte de capital de investidores privados. A proposta de compra por US$ 350 milhões feita pela VarigLog, ainda que aceita pelos credores, corre o risco de ser barrada pelas autoridades. Há suspeitas de que a Volo, a empresa que controla a VarigLog, teria como maior acionista o fundo de investimento norte-americano Matlin Patterson — e a legislação brasileira impede que capital estrangeiro tenha participação superir a 20% do capital de empresas do setor aéreo. Fosse pouco, como mostrou a Folha de S.Paulo, um dos sócios da Volo, Marco Antonio Audi, tem duas ações de execução fiscal por dívida com o INSS, o que impede a aprovação da transferência da VarigLog para a Volo pela Agência Nacional de Aviação Civil.
2 — O próprio governo avalia que a Varig já feriu a Lei de Falências. Pelos termos da recuperação judicial, situação na qual a Varig se encontra, ela pode renegociar as dívidas passadas, mas sem deixar de pagar as despesas correntes. Nesta terça-feira, a empresa depositou R$ 9 milhões em tarifas de embarques — pagas, aliás, pelos passageiros —, que havia deixado de recolher à Infraero. O repasse havia sido suspenso no dia 5 de abril. Mas não mostrou disposição ou sinal de que voltará a pagar as taxas de pousos e decolagens dos seus aviões à estatal. Há 23 dias elas não são pagas. Como são R$ 900 mil ao dia, essa recente dívida representa quase R$ 21 milhões. Uma decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) obrigando a Varig a retomar o pagamento das tarifas.
Restaria, portanto, a terceira via, a ajuda do governo. Dadas as dívidas da companhia com a BR Distribuidora e com a Infraero, para quem deve estimados R$ 500 milhões, seria difícil convencer o Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público Federal a aceitar uma moratória de três a seis meses.
No fundo do poço, a empresa acena com medida que deveria ter tomado há muito tempo: corte de despesas. A Varig promete devolução de 15 aviões às empresas de leasing e cancelamento de linhas regionais. Atuando em uma estrutura menor, se concentraria nas rotas internacionais, mais rentáveis e nas quais a tradição da empresa ainda pesa.
Com o começo da baixa temporada, a situação financeira da Varig tende a piorar, pelo simples motivo de que o fluxo de passageiros se reduzirá, o que significa menos dinheiro no caixa de todo o setor. As manifestações de funcionários da Varig podem causar comoção, saudosistas escreverão folhas e folhas sobre a qualidade dos vôos da companhia, seus defensores afirmarão que todo o setor aéreo sofreu duro impacto com a crise deflagrada com os ataques de 11 de setembro de 2001 ou com o congelamento das tarifas durante o Plano Cruzado, o que é absoluta verdade. Mas a Varig definha por uma conjunção de fatores, entre eles o longo histórico de má administração. A Varig não é vítima. É também agente de sua ruína.
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Publicado em 11 de abril de 2006.